quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Mensalão: O parlamentar comprado trai o povo inteiro (Ayres Britto)


Primeiro: a eleição do presidente

Ele chegou lá. No início da sessão de ontem, conforme as regras, Joaquim Barbosa foi eleito o novo presidente do Supremo Tribunal Federal. Será o 50º presidente e o oitavo mineiro a presidir a corte. Vida longa ao rei. 

Conforme as regras também, Lewandowsky foi eleito vice-presidente. 

Pela regra da humildade, se foi seguida como convém, Barbosa votou em Lewandowsky para presidente e Lewandowsky votou em Carmen Lúcia para vice-presidente.

Daí Celso de Mello, na qualidade de decano da corte historiou o modo de escolha dos presidentes do Supremo do Império à República.

Pela classe dos advogados falou Roberto Caldas: “A nação encontra-se em júbilo”. De fato, mas não havia qualquer júbilo na voz pausada do advogado. Nem um sorriso sobranceiro? Assim não vale, júbilo é para valer e deve ser externado.

Barbosa foi breve e discreto, agradeceu a confiança e a elevada honra em ser eleito. Punto e basta.

Guardei as palavras de Brito sobre Lewandowsky: inteligência fulgurante e desassombro pessoal. Precisará realmente do segundo para suportar os apupos da plebe nos aeroportos. Chico Caruso, tu és um homem de coragem, eu diria desassombrado pela charge publicada. O revisor lendo seu voto num rolo de papel higiênico. Viva a liberdade de imprensa! E Viva a democracia!

Nosso vaticínio sobre a dupla formada pela eleição: viverão às turras, como nas sessões de julgamento.

Segundo: o julgamento

Vamos ao voto de Celso de Mello:

"Estamos falando de uma organização criminosa que se constituiu à sombra do poder, formulando e implementando medidas ilícitas que tinham finalidade à implantação de um projeto de poder"
Sobre a teoria de domínio do fato, segundo Celso de Mello, não pode por si só determinar a condenação de nenhum réu. É preciso que existam provas nos autos.
"Um juízo de condenação não pode basear-se apenas em formulações abstratas", diz.

Celso de Mello concorda que a teoria é melhor aplicada em julgamentos sobre organizações criminosas. "Mas não é disso que estamos falando?"

"Condenam-se tais réus porque existem provas juridicamente idôneas", diz Celso de Mello, negando que o Supremo tenha condenado réus só por serem líderes políticos, como disse Lewandowski sobre o ex-presidente do PT José Genoino
Celso de Mello acompanha o voto de Joaquim Barbosa, e condena José Dirceu, José Genoino, Delúbio Soares, Marcos Valério, Ramon Hollerbach, Cristiano Paz, Simone Vasconcelos e Rogério Tolentino. O ministro absolve Geiza Dias e Anderson Adauto (Fonte: Folha de São Paulo).

Agora vamos ao momento filosófico, meditativo, vamos haurir os conhecimentos jurídicos, constitucionalistas e poéticos de Ayres Britto. Momento declaradamente aguardado com grande expectativa.

Faremos a transcrição das “notas soltas vocalizadas” em forma de frases soltas como um poema (em franca e deslavada homenagem ao ministro):
O que é estranhável nesse caso é a formação argentária de alianças
Estilo excomungado pela ordem jurídica brasileira
Propina, suborno, corrupção,
Efeitos danosos aos valores protegidos pela ordem jurídica
O sentido das alianças é o da transitoriedade
Alianças tópicas, pontuais, episódicas
Aliança formal “ad eternum” desfigura os partidos
Um partido não pode apropriar-se de outro

“Em Van Gogh um girassol se apropriou de Deus” (Manoel de Barros, o poeta pantaneiro)
Um “pool” de partidos
Catastrófico, até,
Partidos açambarcados por uma aliança perene indeterminada no tempo

No vórtice da marcha da insensatez
Esse regime de alianças partidárias
Se fez por um “pool” de empresas enfeixado nas mãos de  Marcos Valério
Compra de deputados pela profissionalização do mediador
Se profissionalizou na sua “expertise” e mobilizou 153 milhões e 700 mil

Argentário, estilo excomungado de fazer política interpartidária
Ressai de cada urna um perfil ideológico
Soberania – “super omnia”, acima de tudo e de todos
Nas palavras de Celso de Mello: “profanador, vendilhão do ofício público”, o parlamentar que se vende
Assim, a soberania popular, o perfil ideológico das urnas é desconfigurado
O parlamentar comprado trai o povo inteiro
Ato do ofício
Mostrar a gravidade dos atos dos corrompidos
Artigo 317 do Código Penal e artigo 333 do Código Penal
É tipo de omissão radical
Abdica por antecipação de fiscalizar, de acompanhar
É a mais danosa das omissões, decai do papel controlador dos atos do Executivo
Isso é fácil de mostrar
Marcos Valério tinha o dom da ubiqüidade
Instinto apuradíssimo de prospecção de dinheiro
A velha, matreira, renitente inspiração patrimonialista entre o público e o privado

Seca e rasamente
Continuísmo governamental, golpe
Golpe na República, a perpetuação no poder

Entrelace de agentes, de réus, de crimes
Embrincamento
Está documentado, está provado
Conexão funcional de fatos
Composição de um mosaico, um cenário
O conjunto da obra
Raciocínio indutivo, pelo que fez concretamente

Nem direito do inimigo
Nem direito do compadrio
Nem raja de sangue no olho
Nem ramalhete nas mãos

Kandinsky: “Não há nada que não diga nada”
Tudo diz algo de si
A prova é a voz dos fatos
Há fatos que silenciam
Há fatos que sussurram
Fatos que verdadeiramente gritam
Expõem as próprias vísceras

Violência contra a sociedade
Contra o Direito
As vísceras expostas dos fatos criminais
Dessa rumorosa causa

O Ministério Público e o relator nos colocaram numa posição cômoda
Avassaladoramente, sufragamos o entendimento do relator

A oposição aos atos do patrão
Não é da vida
Absolvo Geiza Dias

No núcleo político, os signos da culpabilidade
(negritos nossos)
Estocada em Toffoli: citou voto dele sobre indícios e presunção em caso de corrupção. O ministro apressou-se em explicar que tratava-se de corrupção eleitoral. O caso das ligações de trompa em troca de votos.

Interveio Celso de Mello, bíblico: “Não há nada de novo sob o sol”.

Volta o poeta, digo, o ministrou a falar sobre José Dirceu:

          De fato, o primeiro ministro do governo instalado a partir de 2003,
Plenipotenciário,
Delitos de domínio

Volta a intervir Celso de Mello, firme e enfático, (ele, sempre tão fleumático), chegou a bater com o nó do dedo na mesa: “Mácula indelével” ao falar sobre o servidor do povo que viola seu nobre mister.

Mais não pudemos haurir, pois, neste momento, o batidão da advocacia reclamava nossa pronta intervenção e fomos drasticamente retirados do enlevo com tal altas reflexões.

É da vida, ser retirada assim, ao tranco, do enlevo para as miudezas do dia a dia, poetamos com um travo de amargura.

É esta a nossa contribuição sobre o julgamento de ontem aos nossos distintíssimos leitores que honram este Blog, quanto mais distintos quanto mais lêem nosso Blog.

Uma observação antes de terminar: o ministro perorou, falou, (vocalizou, como prefere), e não leu. Como diz o Fausto Silva, quem sabe faz ao vivo.

Por hoje é só e foi bastante, não? Ainda hoje impactados com o julgamento. Por aí há quem chore as pitangas derramadas. É da vida. 

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