Réquiem para os Embargos Infringentes
A reforma do Código de Processo Civil que se avizinha
extinguirá o recurso de embargos infringentes. O processo não pode durar
"ad eternum", dizem muitos. Concordo plenamente. Mas não são os
recursos que prolongam demasiadamente o processo. São os privilégios do Estado
no prazo em dobro e em quádruplo, que também vão acabar com a reforma; é o
recurso de ofício na sentença contra o Estado, que vai acabar; é a falta de
juízes para tantos jurisdicionados; é o Estado brasileiro, sabidamente o maior
demandista de todos. É a estrutura do Poder Judiciário que simplesmente não
funciona a contento.
Como se vê não é o particular que atravanca o judiciário com suas questões privadas, as mazelas apontadas são todas do Estado. Então, pune-se o particular, injustamente, privando-o de mais um recurso.
Outra questão importante é a decantada celeridade, queremos um processo célere a qualquer custo? A rapidez num processo não é garantia de processo legal e justo.
Não faltam detratores ao nosso direito processual, especialmente leigos que elogiam o enxugamento do direito do dito primeiro mundo, especialmente do direito britânico (não tem nem Constituição!).
Em palestra no IAMG – Instituto dos Advogados de Minas Gerais, no ano passado, o Des. Elpídio Donizeti, integrante da comissão de reforma do CPC para honra de Minas Gerais, com sua verve habitual e bom humor, (o que é raríssimo entre os juristas), contou episódio acontecido com emérito processualista brasileiro convidado a falar em um congresso no exterior, ao citar os recursos do direito brasileiro despertou risos, julgando a platéia tratar-se de uma brincadeira. Rimos todos também. Certamente tratava-se de congresso em solo de direito anglo-saxão.
No berço do sistema da commom law, (na Inglaterra simplesmente não existe
o direito de recorrer), o sistema dificulta os recursos, a parte que quiser
deve obter uma autorização para recorrer e, paga-se caro pelo recurso. No livro
“O Moderno Processo Civil – Formas Judiciais e Alternativas de Resolução de
Conflitos na Inglaterra”, Neil Andrews, Ed. Revista dos Tribunais, 2010, o
autor, professor da Universidade de Cambridge, defende a supremacia do sistema
britânico. Sobre nosso processo diz o autor: “As partes têm direito de
recorrer e aqui cabe recurso para tudo”, critica. Sistema bom acredita o
autor é o que tem poucos processos e poucos recursos.
Ora, tem poucos recursos porque
são proibidos e dificultados, dizemos nós outros.
Creio que a discussão sobre a supremacia dos sistemas de
commom law ou civil law é estéril, cada país tem o direito processual que
merece e de acordo com sua tradição e natureza do seu povo.
O que é bom para a Inglaterra não é necessariamente bom para
o Brasil.
Mas a defesa que faço dos infringentes não é retórica, é bem
prática. Por meio deles vi revertida sentença que extinguia o feito no
nascedouro numa ação de outorga de escritura. O Tribunal de Alçada, existente à
época, negou provimento à apelação, e escorada no voto minoritário, vai o
advogado com unhas e dentes à sessão de julgamento para a sustentação oral.
Dois julgadores modificaram o voto proferido no julgamento da apelação, e à
unanimidade, os embargos infringentes foram providos. Aí está a valença dos
embargos infringentes: salvaram a causa.
Enfim, mudam-se os tempos e nós com ele, mudada a lei
teremos que obedecê-la. Talvez numa próxima reforma voltem os embargos
infringentes com outro nome. Ouvi de um entendido na matéria que o direito
processual é como a moda, vai e um dia volta, repaginado, mas volta. Se não
voltar, deixará saudade.
Parabéns Dra.Valéria, grande sábia.
ResponderExcluirQuem sou eu para ser sábia! Quem é o anônimo?
ResponderExcluirPela manutenção dos infringentes! Parabéns pelo artigo!
ResponderExcluirEste comentário foi removido por um administrador do blog.
ResponderExcluirO comentário foi removido, era elogioso mas passou das medidas. Moderação pessoal. Pela atenção, obrigada.
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