terça-feira, 28 de novembro de 2023

Palavras ao vento


Foto Lula Marques, Agência Brasil

Tea for two[1]

Ainda sob impacto da flagrante ausência de notório saber jurídico do mais novo indicado ao STF, o ministro da Justiça, falemos do café pequeno, questões práticas da advocacia.

Um adendo final, o desânimo diante da sabatina procedida pelo Senado Federal, sabidamente "para inglês ver", um chá das cinco para desgosto de cidadãos e contribuintes enquanto o clima é de alegria, alegria[2].

Do lado de cá da ponte lidamos com a diferença de entendimento do que seja prejuízo e urgente entre desembargador relator e advogada.

O novo Código de Processo Civil inaugurou procedimento recursal intimando o advogado a manifestar-se sobre questões prejudiciais levantadas pelo relator ou pela outra parte.

Como se avisasse: vou indeferir, o que tem a dizer? 

Até o momento só tive sucesso numa apelação (curiosamente as partes foram trocadas, nós os apelantes viramos apelados e terceiros tornaram-se apelantes e os apelados sequer constaram, acontece), após a manifestação, o relator suspendeu o feito até o julgamento de ação de nulidade.

Mas no caso do agravo de instrumento em questão, a manifestação e a juntada de acórdãos do STJ e STF favoráveis ao prejuízo e à urgência da parte, adiantaram rigorosamente nada, e repetiram-se as razões do relator para rechaçar o recurso como incabível fora das hipóteses do artigo 1.015 do CPC.

Acórdãos ótimos, os juntados. Enfim, temos ainda o agravo interno. 

Neste mesmo recurso recebi intimação para juntar o comprovante de pagamento das custas recursais e a guia ou comprovar a justiça gratuita. Quid?

O cliente havia pago a guia  em menos de 40 segundos e enviado em pdf.

Respondi prontamente que constituíam os documentos 3 e 4 juntados com a inicial do recurso, logo após as procurações. Mas retirei a última parte, pareceu um tanto acintoso o detalhe da localização.

A manifestação foi treslida, a questão do prejuízo e da urgência, economia processual, etc.

Nenhuma linha da argumentação constou da decisão que veio em bloco, uniforme.

É como se a decisão dissesse em linguagem coloquial: Qual o quê..., isto realmente não existe; que há de mal em chegar à sentença, depois apelação e no tribunal anular-se a sentença para voltar à fase de instrução? 

Tempo? 

Ativo em alta hoje. Dizem até mais valioso que dinheiro. Não há pressa, só advogados e partes têm pressa, me parece. 

Prova imprescindível?

Reclame na apelação.

Tempo razoável de duração de um processo, economia processual.

Palavras, apenas, apenas

Palavras, pequenas

Palavras[3]

 



[1] Tea for Two, Irving Caesar / Vincent Youmans, 1924

[2] Alegria, alegria, Caetano Emmanuel Viana Teles Veloso, 1968

[3] Palavras ao Vento, Antônio Carlos de Morais Pires/Marisa de Azevedo Monte, 1999.

 

segunda-feira, 23 de outubro de 2023

Juiz dá voz de prisão à mãe da vítima

12ª Vara Criminal de Cuiabá/MT -  Audiência - Depoimento da mãe da vítima

Promotora: Primeiro, eu lamento profundamente sua perda. Tá? Com relação ao assassinato do C. O. B., o J. R. G. L., ele está sendo processado por ter matado o seu filho no dia 10 de setembro de 2016. Valendo-se de uma arma de fogo mediante recurso que dificultou a defesa da vítima. O que a senhora sabe deste fato, dona Sílvia?

Mãe da vítima: O que eu sei... na época eu tava trabalhando e, eu conheci ele. Não lembro dele agora, vi ele aqui agora

Promotora: Ele quem?

Mãe da vítima: Esse homem (e aponta para trás sem se virar). 

Promotora: A sra está constrangida de prestar o depoimento na frente dele?

Mãe da vítima: Não. 

Promotora: Prefere que ele se retire?

Mãe da vítima:  Não. Por mim pode ficar aqui, pra mim não é ninguém.

Juiz: É... com seu respeito, se a senhora quer respeito tem que dar respeito.

Promotora: Excelência, é uma vítima enlutada (alerta a promotora).

Juiz: Sim, aqui é o devido processo legal, néé... Está sendo processado, tem a promotora, tem o juiz, tem o advogado que não é excluído da...

Promotora: (Tentando acalmar a situação). Excelência, eu posso continuar a minha pergunta Excelência?

Juiz: (inaudível) respeito. Eu só peço então tem o juiz presidente do feito. eu peço a senhora que por mais que seje doloroso a senhora mantenha a serenidade ou inteligência, é, é, sobre esta circunstância é do réu acusado infelizmente de fato uma perda para a senhora.. Eu acho, tem ...

Mãe da vítima: Senhor, com o respeito da palavra, eu sou uma pessoa inteligente. O fato deu falar que ele não é ninguém, para mim não é ninguém. Isso aí não vai tirar o que eu vou falar aqui, nem vai tirar o que eu penso dele e que ele pensa a meu respeito. Eu não tô nem aí. Eu tô aqui para falar sobre o que aconteceu.

Promotora: Senhora, então, por favor, dona Sílvia, o momento da senhora. A senhora pode esclarecer como que o acusado matou seu filho. Eu não tô ouvindo. Alguém tá falando?

Juiz: Sim, eu estou falando

Promotora:Ah, desculpa. Dr., por que tá baixo.o som do senhor para mim.

Juiz: É...A senhora não tá faltando com o respeito (inaudível).

Mãe da vítima: Desculpa.

Juiz:tá certo... quando falo de inteligência emocional tem que ter, tem que ter, se não tiver vai ser difícil

Mãe da vítima:Se for isso...

Promotora:Não, não, Excelência, eu gostaria que a vítima pudesse manifestar. A vítima e seus familiares têm direito à informação. Ele tem direito a ser ouvido. Ele tem direito a ser acolhido pela Justiça. É só isso. Deixa ela falar. Eu só gostaria que ela falasse. O que que aconteceu.

Juiz: O que não pode é querer desafiar, Dra.

Promotora: Meu Deus, Dr.! Eu não acredito no que está acontecendo nesta audiência... A mãe da vítima tá manifestando, é muito difícil controlar o sentimento...

Juiz: Por que toda hora tem que falar?  (Tom de voz alterado)  Engoliu um rádio, uma radiola, Dra? De novo, Dra?

Promotora: Doutor...

Promotora: Eu não tô ouvindo o que o senhor tá falando. Eu já falei para o senhor...

Juiz: Não para de falar! (exaltado). Pare de falar, por favor!

Promotora: O microfone está baixo, não estou ouvindo.

Juiz: Está encerrada a audiência!

A mãe da vítima visivelmente perturbada levanta-se rapidamente e bate a mão na mesa.

Mãe da vítima: Da justiça divina não escapa! (para o réu).

Juiz: A senhora está presa! Senhora tá presa!

Promotora: Não, Dr. !!!

Sala das Audiências, 29 de setembro de 2023.

Desfecho: A mãe da vítima foi contida por dois homens e levada à Delegacia.

Noticiam os veículos que o juiz afirmou haver dado voz de prisão pelo fato da mãe da vítima haver danificado um patrimônio público (bebedouro) com um copo (de papel).

Inacreditável, mas verídico. Vídeo em alta na web.

quinta-feira, 7 de setembro de 2023

Desembargador do TJMG é indicado para vaga de ministro do STJ


O presidente Luiz Inácio Lula da Silva indicou, nesta quarta-feira (6), os desembargadores José Afrânio Vilela, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), e Teodoro Silva Santos, do Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE), para as duas vagas de ministro em aberto no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Os escolhidos serão agora submetidos a sabatina no Senado Federal e, se aprovados em plenário, serão nomeados pelo chefe do Executivo e empossados em sessão solene do tribunal.



José Afrânio Vilela tem formação em direito pela Universidade Federal de Uberlândia e pós-graduação em gestão judiciária pela Universidade de Brasília. Tomou posse como juiz em 1989 e ocupa o cargo de desembargador do TJMG desde 2005. Atuou como vice-presidente do tribunal mineiro no biênio 2018/2020.


José Afrânio Vilela e Teodoro Silva Santos foram escolhidos em uma lista de quatro nomes formada pelo Pleno do STJ no dia 23 de agosto. As vagas no tribunal decorrem da aposentadoria do ministro Jorge Mussi e do falecimento do ministro Paulo de Tarso Sanseverino.

quinta-feira, 31 de agosto de 2023

Pode citação pelo WhatsApp?

 


A lei processual não prevê a utilização de aplicativo de mensagens como meio de citação; ocorre que havendo ciência inequívoca da ação judicial a citação será válida.

Este foi o entendimento da Terceira Turma do STJ ao anular uma citação realizada pelo WhatsApp. Isto porque a ré não sabia ler nem escrever. Ademais o mandado de citação foi enviado para o celular da filha da ré, em uma ação de destituição do poder familiar na qual a citanda ficou revel.

A relatora Ministra Nancy Andrighi entendeu que a citação pelo WhatsApp possui vício de forma diante da ausência de regulação legal, sendo passível de anulação.

Ocorre que havendo a ciência inequívoca, ou seja, atingindo o ato seu fim de cientificar o réu do conteúdo de despacho judicial estará superado o vício de forma e será considerada válida a citação.

No caso em julgamento foi constatado evidente prejuízo para a ré, pois, sem saber ler e escrever estava impossibilitada de compreender o teor do mandado de citação e da contrafé (cópia da petição inicial), tornando-se revel no processo.

Conforme determina o artigo 247, II do Código de Processo Civil a citação será feita pelo correio para qualquer comarca do país, exceto quando o citando for incapaz.

Admitida, pois, a citação pelo WhatsApp aos letrados.

Pode citação pelo WhatsApp? Se houver ciência inequívoca da ação judicial, sim, segundo a Terceira Turma do STJ.

 

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Fonte: Assessoria de Imprensa do STJ

 

segunda-feira, 7 de agosto de 2023

150 anos - sete tribunais e uma sessão solene

Ontem, 6 de agosto, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais fez 150 anos.

No dia 6 de agosto de 1873 com  publicação do decreto imperial de Dom Pedro II foi criado o Tribunal da Relação de Minas, com sede em Ouro Preto, capital da Província.

O Decreto Nº 2.342, DE 6 DE AGOSTO DE 1873 além do Tribunal da Relação de Minas Gerais criou mais 6 tribunais, de São Paulo, Goiás, Mato Grosso Ceará, Pará e Rio Grande do Sul.

Hoje 7/8/23 houve sessão solene do Pleno do TJMG para comemorar a data histórica à altura.C om a presença do governador e demais autoridades dos poderes, instituições e armas do estado. 

Há dias o site do TJ informava a presença dos Dragões da Inconfidência e do Quarteto de Cordas da Orquestra do Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais.

A sessão cívica solene foi longa. Longos discursos, à exceção do Governador Romeu Zema que não levou discurso escrito. E foi breve.

Há tempo para tudo segundo o texto milenar, citou o orador, decano do Tribunal.

Eclesiastes. Evitou o termo bíblico, concluí. Comemorar, reunir em exaltação de algo.  Consultarei minhas notas, citações de Camões. Se tão sublime preço cabe em verso, Os Lusíadas, Camões. 

A projeção ou protagonismo de cada poder nos últimos três séculos. Século dezenove, legislativo; vinte, executivo e vinte e um, o século do poder judiciário. 

Ninguém no Brasil duvidará disto. Tal e qual, dizemos nós. Mas diferentemente do senso de nosotros, o orador atribuía tal projeção à evolução do direito das mulheres, da infância, e etc..

Fechou com Camões, sobre a alta honra do encargo: se a tanto me ajudar engenho e arte, id ibidem.

O chefe do Ministério Público citou Adélia Prado, me atravessa um rio profundo. 

Os versos textuais da autora de Divinópolis:

O silêncio de quando nos vimos a primeira vez atravessa a cozinha como um rio profundo.

Terá sido mero acaso diante da composição da mesa de honra? 

O governador do estado não citou literariamente nenhum autor, mas citou nominalmente os presidentes anteriores do tribunal com os quais afirmou haver aprendido muito. Enalteceu o TJMG. E foi breve, frise-se.

O Presidente do Tribunal citou Guimarães Rosa, para falar de Minas, aurífera, ferrífera ..., misteriosa porção do Brasil.

Misteriosa porção do Brasil. De fato. Pesquisei os sites dos demais tribunais criados pelo Decreto Imperial e que completam 150 anos. 

Ao que consta (nada), só em Minas houve sessão solene. Com guarda de honra e música clássica. E citações literárias de autores mineiros e do poeta maior português.

No site do TJSP, é bem verdade, consta o documento digital coletivo dos 7 tribunais pela efeméride.

Sessão solene só aqui. Tradicionalistas. Com homenagem aos estados irmãos pelo decreto imperial.

Este foi o ponto comovente da sessão: os mais antigos funcionários do tribunal adentraram portando as bandeiras dos estados do Ceará, Pará, Mato Grosso, Goiás, São Paulo e Rio Grande do Sul para entronizá-las, sendo aplaudidos de pé por autoridades, desembargadores e demais presentes.

Como escreveu Guimarães Rosa: 

Minas, Minas Gerais, inconfidente, brasileira, paulista, emboaba, lírica e sábia, lendária, épica, ..., árcade, ..., arcaica, mítica, enigmática, ... municipalíssima, paroquial, ..., humanista, política, sigilosa, ..., legalista, legal, governista, revoltosa, ...  (Texto publicado na revista “O Cruzeiro”, em 25 de agosto de 1957).



Encerramento Trenzinho Caipira Heitor Villa-Lobos

quinta-feira, 20 de julho de 2023

Advogados já foram melhor tratados





Advogados já foram melhor tratados. Foi o que me ocorreu ao entrar no edifício que abriga e abrigará durante muito tempo as varas de sucessão da Capital. Não é pelo fato do prédio ser antigo; não. Nem pela fresta da porta do elevador mostrando os andares, luz e sombra, luz e sombra; de maneira alguma. O lay out sombrio do saguão? As cadeiras de plástico enfileiradas? A presença ostensiva de policiais? Não, e não.

Volto ao assunto das barreiras. A primeira de guardas, mas não policiais. Policiais militares há também, demonstrando que funcionam ali varas criminais. É comum advogados e servidores com presos algemados no elevador. Voltando às barreiras. Revista de bolsa é possível. A senhora é advogada? Intimamente me pergunto, quem em sã consciência viria bater aqui, disposto a romper um par de obstáculos físicos e humanos, de casaco de tweed, nesta quinta-feira nublada senão no exercício do dever profissional? Respondo educadamente que sim. Sou intimada a dizer aonde vou. Digo.

Passada a primeira barreira encontra-se a segunda, um balcão com três funcionárias. Carteira da OAB, exigem. Aonde vai? (De novo?). 

Superados os obstáculos podemos adentrar ao elevador com a assustadora fresta na porta automática de luz e sombra.

Já na secretaria comentei com a advogada companheira da prova de barreiras que advogados já foram melhor tratados. No momento atual são revistados, vigiados, intimados a declarar aonde vão.

Dito e feito. Minutos depois nova demonstração dentro da secretaria da vara. O funcionário do balcão com alguma má-vontade foi ao computador consultar o processo e me disse lá do computador que a questão era complexa (um pedido de alvará), e que devo, se quiser, peticionar de novo. 

Pela terceira vez? pergunto. Não é possível. 

Me interrompeu para perguntar algo rude com a condescendência de quem fala a um ignorante do serviço ou a um subalterno: eu estou explicando, a senhora pode ouvir?

Alto lá. De pronto retorqui: E o senhor pode tratar a advogada com gentileza?

Negou a grosseria. Mantive. Educado é o que ele não foi. O caldo engrossou. O que fazer nestas horas? Chama-se o escrivão. No caso, funcionário em substituição, o escrivão estava de férias, alçado à função por competência e serenidade. Não precisei chamar, o próprio funcionário passou imediatamente a questão.

Ótimo. Pudemos então falar a mesma língua e no mesmo tom adequado ao ambiente forense. E devido aos advogados. Aliás a qualquer jurisdicionado. A qualquer um do povo, todos nós.

A vara está sem juiz titular. Há juiz itinerante que vem despachar e também atender outras varas. É a segunda vez que venho resolver a mesma questão. Já conversei com a assessoria da outra vez e levei as duas petições impressas para facilitar. Parece que não adiantou muito. Parece que as petições não têm sido lidas. 

E as partes, no caso, herdeiros, leigos, a imaginar que algo muito grave deve estar acontecendo neste processo, pois, não anda por mais que se peticione.

Conheço um advogado que costuma levar o cliente quando vai à secretaria para que ele se dê conta de como funciona ou não a serventia. E que há coisas muito além do que pode o advogado.

Serei o assunto do cafezinho de amanhã, com amargas queixas do funcionário reiterando que não foi, de forma alguma, ríspido com a advogada.

Seguinte: advogados já foram melhor tratados. Isto foi em um outro país. Uma outra época que, infelizmente não conheci.

Li e guardei de um livro de Rudolph Von Ihering que o primeiro dever do advogado é com ele mesmo.

Algo me diz que agora andará a bom termo.

Do contrário estarei pela enésima vez a dar com os costados na serventia.

quinta-feira, 13 de julho de 2023

Declaração de indignidade por ofensa à honra do falecido exige prévia condenação criminal do sucessor


Ao estabelecer que a declaração de indignidade por ofensa à honra do autor da herança depende de prévia condenação criminal, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao recurso especial interposto por uma viúva que buscava excluir do processo sucessório os filhos do marido falecido.

Para o colegiado, a exigência de condenação anterior está prevista no artigo 1.814, II, segunda figura, do Código Civil e se justifica porque as desavenças familiares são recorrentes, razão pela qual a ofensa à honra proferida pelo herdeiro deve ser grave a ponto de dar origem à ação penal privada proposta pelo autor da herança, com reconhecimento de todos os elementos que configuram a infração penal.

Na origem do processo, a viúva moveu uma ação declaratória de reconhecimento de indignidade contra os dois filhos do marido, sob o argumento de que eles praticaram denunciação caluniosa e crime contra a honra do genitor. O juiz de primeiro grau negou o pedido, pois as mensagens que supostamente causaram a ofensa não seriam suficientes para configurar crime e nem sequer foram objeto de ação penal.

O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) também julgou o pedido improcedente, por entender que a condenação criminal é imprescindível para a declaração de indignidade. Após a decisão, a viúva interpôs recurso especial, no qual alegou ser inexigível a prévia condenação criminal por ofensa à honra para o reconhecimento da indignidade pelo juízo cível.

Contexto familiar motiva exigência de prévia condenação por lesão à honra

Segundo a relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, a necessidade de prévia condenação criminal dos supostos ofensores, para que se possa declarar a indignidade, é um tema altamente controvertido na doutrina brasileira. No entanto – explicou a ministra –, a tendência majoritária afirma que, nas hipóteses de possível lesão à honra do autor da herança, é imprescindível que ela tenha sido apurada e reconhecida em decisão judicial proferida em processo criminal.

A relatora acrescentou que o Código Civil é expresso ao dizer que a declaração de indignidade depende da existência de crime contra a honra do autor da herança, de seu companheiro ou cônjuge, o que pressupõe a existência de sentença penal nesse sentido.

No entendimento da ministra, essa interpretação restritiva se explica porque é comum, no contexto familiar, a existência de desentendimentos que, por vezes, resultam em ofensas verbais.

"Faz sentido que o legislador, antevendo essa possibilidade, tenha limitado o reconhecimento da indignidade apenas à hipótese em que essas ofensas sejam realmente muito sérias e se traduzam, efetivamente, em ilícitos penais que somente podem ser apurados, em regra, por ação penal privada de iniciativa do próprio ofendido", destacou a relatora.

Postura do ofendido sobre possíveis ofensas à honra deve ser considerada

A ministra lembrou que o STJ tem precedente que analisa a dinâmica das relações familiares à luz da mesma situação, e o posicionamento adotado trata a condenação criminal como pressuposto para excluir da sucessão o herdeiro que cometer crime contra a honra do falecido.

Ainda de acordo com Nancy Andrighi, o caso apresenta clara diferença entre o que seria uma ofensa à honra no contexto familiar e a prática de um crime contra a honra nesse mesmo cenário.

"Se o ofendido não pretendeu buscar a sanção penal em vida (ou, se pretendeu, não a obteve), não faz sentido que se apure o eventual ilícito, após a sua morte e apenas incidentalmente no juízo cível, com o propósito de excluir o suposto ofensor da sucessão", concluiu a relatora.

Leia o acórdão no REsp 2.023.098.

Fonte: Assessoria de Imprensa do STJ

quarta-feira, 5 de julho de 2023

Cálculo do ITBI em Belo Horizonte terá como base o valor declarado pelo contribuinte

 

A Lei Nº 5.492/1988 que estabelece a regra de cálculo do valor do Imposto Sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) em Belo Horizonte/MG foi alterada.

 A nova redação, publicada no Diário Oficial Municipal (DOM) determinada pela  Lei Nº 11.530 na última quinta-feira (29/6), determina que a base de cálculo do imposto deve considerar o valor declarado pelo contribuinte como o valor real da transação e não mais o valor estimado pelo Fisco municipal.

LEI Nº 11.530, DE 28 DE JUNHO DE 2023

 

Altera os arts. 5º e 16 da Lei nº 5.492/88, que “Institui o Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis por Ato Oneroso ‘Inter Vivos”.

 

O povo do Município de Belo Horizonte, por seus representantes, decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

 

Art. 1º - O caput, o § 1º e o caput do § 3º do art. 5º da Lei nº 5.492, de 28 de dezembro de 1988, passam a vigorar com a seguinte redação:

 

“Art. 5º - A base de cálculo do imposto de que trata esta lei é o valor venal dos bens ou dos direitos transmitidos ou cedidos em condições normais de mercado.

 

§ 1º - O valor da transação declarada pelo contribuinte no instrumento de aquisição dos bens ou dos direitos transmitidos ou cedidos goza da presunção de ser o valor de mercado, que somente pode ser afastado, nos termos do regulamento, mediante regular instauração de processo administrativo próprio.

[...]

§ 3º - Para a apuração do valor venal dos bens ou dos direitos transmitidos ou cedidos, por meio de processo administrativo próprio, nos termos do § 1º deste artigo e na forma prevista em regulamento, serão considerados, dentre outros, os seguintes elementos quanto ao imóvel:”.

 

Art. 2º - Os incisos I e II do § 1º do art. 16 da Lei nº 5.492/88 passam a vigorar com a seguinte redação:

 

“Art. 16 - [...]

 

§ 1º - [...]

I - contrato particular de promessa de compra e venda do terreno ou de sua fração ideal;

II - contrato de prestação de serviços de construção civil, celebrado entre o adquirente e o incorporador ou construtor;”.

 

Art. 3º - Ficam revogados os §§ 6º, 7º e 8º do art. 5º da Lei nº 5.492/88.

 

Art. 4º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação, produzindo efeitos em 180 (cento e oitenta) dias a partir dessa data.

 

Belo Horizonte, 28 de junho de 2023.

 

Fuad Noman

Prefeito de Belo Horizonte

 

(Originária do Projeto de Lei nº 355/22, de autoria do vereador Braulio Lara)

 

Note-se que o artigo 4º da lei contém incorreção ao dizer “Esta lei entra em vigor na data da sua publicação, produzindo efeitos em 180 dias a partir desta data”.

A lei não entrou em vigor na data da publicação justamente porque determinou o período de 180 dias para produção de efeitos, a vacatio legis, período entre a publicação e a entrada em vigor.

A lei foi somente publicada e somente entrará em vigor 180 dias a partir de 29/06/2023, data da publicação no DOM – Diário Oficial do Município.

Isto porque a Lei Complementar N.º 95/98 disciplina a matéria da seguinte forma:

Art. 8º A vigência da lei será indicada de forma expressa e de modo a contemplar prazo razoável para que dela se tenha amplo conhecimento, reservada a cláusula "entra em vigor na data de sua publicação" para as leis de pequena repercussão.

§ 1º A contagem do prazo para entrada em vigor das leis que estabeleçam período de vacância far-se-á com a inclusão da data da publicação e do último dia do prazo, entrando em vigor no dia subsequente à sua consumação integral. (Parágrafo incluído pela Lei Complementar nº 107, de 26.4.2001).

§ 2º As leis que estabeleçam período de vacância deverão utilizar a cláusula ‘esta lei entra em vigor após decorridos (o número de) dias de sua publicação oficial’. (Parágrafo incluído pela Lei Complementar nº 107, de 26.4.2001).

 

quarta-feira, 10 de maio de 2023

Uma palavra, dois sentidos

   


Anoiteceu. A luz do computador brilha no breu da sala, caro leitor. Estava aqui baixando documentos de ações e recursos, fazendo protocolos e ao mesmo tempo informando e enviando pelo WhatsApp aos clientes. Não é mesmo formidável no que se transformou a advocacia em tempo real?

A palavra tem origem no latim formidabilis, “o que causa medo, terrível”, e ainda, "pavoroso, diabólico, horrendo, assustador"; portanto, não há de ser boa coisa. Lembremos ainda de formicida.

Por outro lado, aceso o abajur e vislumbrada a luz no fim do túnel, há também o significado de “maravilhoso, excelente, fantástico”.

Deixarei como maravilhoso, excelente e fantástico não o multitarefa ambulante que se tornou o advogado, mas a decisão, aliás, a Decisão com “d” maiúsculo do Relator da apelação que sim, suspendeu a ação em grau de recurso até o julgamento da querela nullitatis de sentença de usucapião.

Para o leitor leigo que supõe grego clássico o escrito acima, a tradução: a história é mesmo longa e intrincada, valerá a pena narrar aqui? Creio que não, aborrecerá muito os leitores leigos.

Tentei uma sinopse, mas há tantos detalhes que descambam em questões de direito que desisti.

Sugiro que saltem para os últimos parágrafos ignorando o latinório jurídico, da mesma forma como li O Nome da Rosa, de Umberto Eco, saltando o latim de par em par.

Num esforço de reportagem para quem se atrever:

Em 1962 o pai comprou a prazo em nome dos filhos menores um lote. Não há contrato escrito, o famoso compromisso de compra e venda. Há apenas um recibo do sinal constando como adquirentes Fulano e irmãos menores; as notas promissórias resgatadas e um recibo de 1967. Fulano de tal falece em 2008. Na Prefeitura Fulano de Tal consta como titular do imóvel para fins de IPTU.

Em 2016 foi proposta ação de outorga de escritura por três dos filhos menores a esta altura já aposentados.

Na época da sentença em 2022 o juiz determinou a juntada de certidão atualizada. O documento apresentado pelos autores era uma certidão de transcrição da transmissão, o que demonstra a antiguidade da aquisição do bem pelo vendedor, muito antes da Lei de Registros Públicos, na verdade em 1935.

Com a atualização da certidão em 2022 descobriu-se que em 2019 foi averbada sentença de usucapião quanto ao lote objeto ação judicial em favor de terceiros.

Assim, no curso da ação de outorga já em fase de sentença houve a informação de fato que exigiu a propositura de ação declaratória de nulidade da sentença de usucapião; o que foi feito em dezembro de 2022, e até abril de 2023 não havia ainda, despacho inicial.

Veio a sentença da primeira ação, improcedente, exigindo matrícula quando a matrícula só foi instituída pela lei posterior ao contrato.

A Lei de Registros Públicos LEI Nº 6.015, DE 31 DE DEZEMBRO DE 1973 regulou o registro de imóveis na forma como conhecemos hoje; antes dela não havia a “matrícula”.

No Tribunal o Relator que leu o processo, a certidão e todas as averbações intimou os apelantes a manifestarem-se sobre a sentença de usucapião, fato que constitui óbice ao direito alegado.

De fato, representa óbice mas não afasta a necessidade da ação de outorga para obtenção do título de propriedade. A necessidade permanece.

Como a ação de usucapião foi proposta no curso da ação de outorga e ignorada até aquele momento, requereu-se a suspensão da ação de outorga até o trânsito em julgado da ação anulatória da sentença de usucapião.

A decisão, sucinta como o pedido, determinou a suspensão da ação de outorga. Oh, glória.

Observem este belo trecho: 

Nesse passo, ... os autores, ora apelantes, ajuizaram a ação anulatória de n°... Certo é que o julgamento de mérito daquela demanda reflete em eventual direito adjudicatório dos autores, ou ainda em prejudicialidade desta demanda. Desta feita, determino a SUSPENSÃO desta ação até o trânsito em julgado da ação anulatória de n°..., com fulcro no art. 313, V, “a” do CPC.

 Nesse passo, desta feita, determino a suspensão, quase um poema.

 Formidável, no segundo sentido.  

segunda-feira, 24 de abril de 2023

Tratamento multidisciplinar de autismo deve ser coberto de maneira ampla por plano de saúde

 


A Terceira Tuma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento a recurso especial da Amil Assistência Médica Internacional que questionava a cobertura do tratamento multidisciplinar – inclusive com musicoterapia – para pessoa com transtorno do espectro autista (TEA) e a possibilidade de reembolso integral das despesas feitas pelo beneficiário do plano de saúde fora da rede credenciada.

A relatora, ministra Nancy Andrighi, comentou que, embora a Segunda Seção do STJ tenha considerado taxativo o rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), o colegiado, no mesmo julgamento do ano passado (EREsp 1.889.704), manteve decisão da Terceira Turma que concluiu ser abusiva a recusa de cobertura de terapias especializadas prescritas para tratamento de TEA.

A ministra destacou que, após várias manifestações da ANS reconhecendo a importância das terapias multidisciplinares para os portadores de transtornos globais de desenvolvimento, a agência reguladora publicou a Resolução Normativa (RN) 539/2022, que ampliou as regras de cobertura assistencial para TEA. A agência também noticiou a obrigatoriedade da cobertura de quaisquer métodos ou técnicas indicados pelo médico para transtornos globais de desenvolvimento.

TJSP reincluiu musicoterapia no tratamento multidisciplinar

No caso julgado agora, o beneficiário, menor de idade, ajuizou ação contra a Amil pretendendo a cobertura do tratamento multidisciplinar prescrito, sem limite de sessões, bem como o reembolso integral das despesas.

O juízo de primeira instância atendeu o pedido quanto ao tratamento sem limite de sessões, mas excluiu a musicoterapia, que foi reincluída pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) no julgamento da apelação.

No recurso ao STJ, a Amil alegou que os tratamentos não tinham cobertura contratual nem constavam da RN 465/2021 da ANS, e contestou a obrigação de reembolsar integralmente as despesas em clínicas não credenciadas.

ANS afastou exigência para várias coberturas

Em relação à musicoterapia, a relatora apontou que ela foi incluída no Sistema Único de Saúde por meio da Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares, e a ocupação de musicoterapeuta foi reconhecida pelo Ministério do Trabalho, passando a integrar o tratamento multidisciplinar de TEA a ser coberto obrigatoriamente pelos planos de saúde, quando prescrita pelo médico.

Nancy Andrighi apontou ainda que, ao editar a RN 541/2022, a ANS alterou a RN 465/2021 (mencionada pela Amil em seu recurso) para revogar as condições exigidas para a cobertura obrigatória de psicólogos, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais e fisioterapeutas.

Diante do entendimento jurisprudencial do STJ e das diretrizes adotadas pela ANS, a ministra endossou a decisão do TJSP de impor ao plano a obrigação de custear o tratamento multidisciplinar, incluída a musicoterapia.

Reembolso integral só com violação de contrato, ordem judicial ou norma da ANS

A ministra ressaltou que a recusa da Amil se baseou no fato de as terapias prescritas não constarem no rol da ANS, não havendo, à época, determinação expressa que obrigasse as operadoras de saúde a custeá-las.

Na avaliação da relatora, não caracteriza inexecução do contrato – a qual justificaria o reembolso integral – a recusa de cobertura amparada em cláusula contratual que tem por base as normas da ANS. Como os fatos foram anteriores à RN 539/2022, a ministra decidiu que a Amil só terá de reembolsar integralmente as despesas se tiver descumprido a liminar concedida no processo. Caso contrário, o reembolso será nos limites da tabela da operadora.

"A inobservância de prestação assumida no contrato, o descumprimento de ordem judicial que determina a cobertura ou a violação de atos normativos da ANS pela operadora podem gerar o dever de indenizar, mediante o reembolso integral, ante a caracterização da negativa indevida de cobertura", concluiu.

Leia o acórdão no REsp 2.043.003.

 Fonte: Assessoria de Imprensa STJ

terça-feira, 18 de abril de 2023

Lei dispensa aval do cônjuge em esterilização

 


Está em vigor desde março a lei que colocou fim à obrigatoriedade de aval do cônjuge para procedimentos de laqueadura e vasectomia. 

A Lei 14.443, de 2022, também reduziu de 25 para 21 anos a idade mínima de homens e mulheres para a  esterilização voluntária.

Alteração

A mudança ocorre por meio da alteração da Lei do Planejamento Familiar (Lei 9.263, de 1996). 

A lei diminui de 25 para 21 anos a idade mínima, em homens e mulheres, de capacidade civil plena, para submeter-se a procedimento voluntário de esterilização. 

Esse limite de idade, no entanto, não é exigido de quem já tenha ao menos dois filhos vivos. 

Além disso, foi revogado um dos dispositivos da Lei 9.263, por isso não será exigido o consentimento expresso de ambos os cônjuges para que ocorra a esterilização.

A lei mantém o prazo mínimo de 60 dias entre a manifestação da vontade e o ato cirúrgico. Nesse tempo, a pessoa poderá acessar o serviço de regulação da fecundidade, com o acompanhamento de uma equipe multidisciplinar, para possibilitar ao paciente uma possível desistência do procedimento. 

Por outro lado, a proposição inova ao permitir à mulher a esterilização cirúrgica durante o período de parto. 

Fonte: Agência Senado

segunda-feira, 3 de abril de 2023

O que fica


Amanhã às 11:00h haverá reunião solene de descerramento de retrato na Faculdade de Direito da UFMG, também conhecida como a Vetusta Casa de Afonso Pena, ou simplesmente "a Vetusta".

O retrato é de aluno falecido durante o curso de direito em 1929, ano da sua formatura.

Trata-se de do poeta Ascânio Lopes, um dos fundadores da revista Verde, um dos ícones do Movimento Modernista.

Com ele morreu também a revista. Sendo a última edição, de número 6, em homenagem ao poeta falecido.

Na derradeira edição Carlos Drummond de Andrade em uma crônica revela que o promissor poeta foi, porém, mau aluno; mas elogiou o esforço, a "pachorra" de frequentar o curso de direito.

Ele que conseguiu cursar farmácia, não por escolha, mas por facilidades burocráticas, pois, expulso do Colégio Jesuíta em Nova Friburgo por "insubordinação mental" não possuía o diploma do curso secundário, além do que o curso de farmácia era o mais breve, três anos. Da expulsão guardou mágoa por toda a vida: "Perdi a fé. Perdi tempo. E sobretudo perdi a confiança na justiça dos que me julgavam. Mas fiz alguns amigos inesquecíveis."

O que releva no homenageado não é o brilhantismo acadêmico. Nada importa para a História. Mas sim o arrojo, o promissor talento do "Verde" Ascânio Lopes.

O cineasta Humberto Mauro (de paletó cinza, debruçado na escada) recebe os jovens da "Verde" durante a filmagem de "Sangue Mineiro".


Persistência contra jurisprudência majoritária

E nquanto a nossa mais alta corte de justiça, digo, um dos seus integrantes, é tema no Congresso americano lida-se por aqui com as esferas h...