quinta-feira, 10 de maio de 2012

Aprovada na Argentina lei da morte digna


O Senado argentino aprovou ontem a chamada lei da morte digna, permitindo a parentes recusar o prolongamento da vida de modo artificial quando os pacientes estiverem em quado terminal ou irreversível.

Segundo a lei o consentimento para interrupção do tratamento  poderá ser dado pelo paciente, por familiares diretos ou por representantes legais. Inclui o direito de recusar alimentação, hidratação e reanimação artificial. Os médicos e assistentes envolvidos em casos assim não poderá ser penalizados.
O caso  mais conhecido na Argentina é o da menina Camila, de 3 anos, que nasceu morta, foi reanimada e é mantida por aparelhos. A mãe da criança, Silvia Hebrón, defende a lei e afirma que gostaria que os aparelhos que a mantém viva fossem desligados. A expressão da vontade do paciente pode ser feita, também antecipadamente. Deve ser realizada por escrito diante de escrivão ou em tribunal de primeira instância com a presença de testemunhas. Até o momento o único país latino-americano a ter uma lei de morte digna era a Colômbia, que regulamentou a matéria em 1997.

No Brasil a falta de lei específica leva os brasileiros a formalizar em cartório como e quando querem partir.
Apenas no 26º Tabelionato de Notas de São Paulo, um dos maiores cartórios do país, o número de pessoas que registraram o documento, chamado testamento vital, cresceu quase 20 vezes, passando de 22 em 2002 para 406 em 2011. Em 2012 já foram lavradas 90 declarações. Constam dos testamentos vitais desde o tipo de tratamento a ser rejeitado no caso de doenças incuráveis em fase terminal, ao local da morte e opção pela cremação.

A secretária-executiva aposentada, Maria Celina Rubo, de São João da Boa Vista, SP, fez o seu quando descobriu em exame de rotina apresentar a mesma moléstia que acometeu sua mãe, obstrução do intestino. Na ocasião, os quatro filhos optaram por não autorizar uma cirurgia que deixaria a senhora de 83 anos com uma bolsa de colostomia. Sema operação ela viveu três anos com qualidade de vida e morreu quando o intestino fechou de vez em 2008. "Senti uma paz de espírito quando meu advogado me entregou o documento. Agora, tenho certeza de que mesmo que eu esteja sedada, em coma ou desmaiada, os médicos vão respeitar a minha vontade. Quero uma morte natural",  diz a mulher, hoje saudável.

Em Belo Horizonte/MG, o Escrevente Substituto do Cartório do 3º Ofício de Notas, Wander Araújo, informa que até o momento não consta nenhum testamento vital realizado na serventia.

O Conselho Federal de Medicina trabalha atualmente para elaborar uma resolução sobre os testamentos vitais.

A Resolução 1.805/2006 do CFM (proposta pela Câmara Técnica de Terminalidade da Vida)  garante ao médico brasileiro o direito de fazer ortotanásia caso seja a vontade do paciente ou de seu representante legal, poupando o paciente de tratamento inútil ou doloroso, invocando o art. 5º, III da CF (ninguém deve ser submetido a tortura ,nem a tratamento desumano ou degradante). Veja a resolução na íntegra no site do CFM www.portalmedico.org.br.

Pesquisa da Universidade de Brasília realizada em 2011 com 15 médicos de unidades de terapia intensiva (UTI's) mostrou que a metade desconhecia o conceito correto de ortotanásia.

Projeto de Lei: Em 2009 o Senado Federal encerrou a votação do Projeto de Lei nº 116/2000 do autoria do Senador do  PMDB-ES Gerson Camata, que exclui de ilicitude a ortotanásia. A proposta estava em tramitação na casa há 9 anos.

No dia 22/12/2011 foi remetida à Câmara dos Deputados, constituído o  Projeto de Lei 6715/2009.

Situação: Aguardando Parecer na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC)
Origem: PLS 116/2000
 Inteiro teor
13/07/2011
Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC )
§                  Aprovado requerimento do Sr. Pastor Marco Feliciano que requer a realização de Audiência Pública para debater o Projeto de Lei nº 6.715, de 2009, que "altera o Decreto-Lei nº 2.848, de 07 de dezembro de 1940 (Código Penal), para excluir de ilicitude a Ortotanásia".


Conceitos:
Ortotanásiagrego ortho (direito) + thanatos (morte) e significa “morte correta, natural”, morte na hora certa, nem antecipada nem postergada. Significa, por exemplo, suspender ou não prover o respirador, evitar  reanimação em caso de parada cardíaca ou não iniciar um tratamento de hemodiálise no paciente que já entrou no processo irreversível de morte. O médico não age, deixa de prolongar por meios artificiais uma vida sofrida que mostra-se irrecuperável. É a eutanásia passiva.

Eutanásia: eu (bom) + thanatos (morte), ou seja, “boa morte”. procedimento ativo com o fim de antecipar a morte. Pode ser feita com aplicação de medicação no paciente.

Distanásia: dys (ruim) + thanatos (morte), ou seja, “morte ruim, sofrida”. obstinação terapêutica ou futilidade médica, prolongamento exagerado da morte de um paciente terminal ou tratamento inútil.

Casos emblemáticos 
Terry Schiavo Norte-americana de 41 anos teve uma parada cardiorrespiratória em 1990 que ocasionou um grave dano cerebral, fazendo-a entrar em estado vegetativo persistente.  O marido dela pediu à Justiça americana a retirada da sonda de alimentação, mas os pais e o irmão dela foram contrários ao ato. Terry não tinha deixado um testamento, mas o marido alegava que ela já tinha manifestado a vontade de não passar por uma situação semelhante quando estava lúcida. Os pais negavam essa afirmativa. Contudo, como pela legislação americana o marido era o responsável legal, a Justiça autorizou a retirada da sonda em 19 de março de 2005.  Terry  faleceu 12 dias depois. O caso foi interpretado como eutanásia.
Ramón Sampedro Na história real que deu origem ao filme Mar adentro, Ramón Sampedro sofreu uma lesão na coluna. Ele tinha 26 anos e ficou tetraplégico. Em 1993, solicitou na Justiça  espanhola o direito de morrer. Enfrentou cinco anos de batalha judicial, mas teve o pedido negado, pois a legislação espanhola proíbe a eutanásia. Com auxílio de amigos, planejou sua morte de modo que cada um fizesse um ato que não fosse considerado auxílio ao suicídio nem homicídio. Em 1998, o cianureto foi colocado em um copo pelos amigos, mas foi ele quem levou a boca ao canudo e sugou o conteúdo. Sampedro gravou um vídeo com seus últimos momentos de vida. O caso é apontado como suicídio assistido.

Piergiogio Welby Desde os 18 anos, Piergiogio sofria de distrofia muscular progressiva. Aos 60, vivendo conectado a um respirador artificial, solicitou à Justiça italiana o direito de desligar os aparelhos. Perdeu a ação e escreveu uma carta para o então presidente, Giorgio Napolitano, com o objetivo de sensibilizá-lo sobre seu sofrimento. O comunicado deu início a uma grande comoção social. Em 21 de dezembro de 2006, o médico anestesista Mario Ricco desligou o respirador após sedar o paciente. O profissional foi processado criminalmente, mas a juíza Zaira Secchi o absolveu, sob o argumento de que o médico apenas respeitou a vontade do paciente, lembrando que a Constituição italiana concede o direito de rejeitar tratamento médico.

Vincent Humbert Documentada em primeira pessoa no best-seller Peço o direito de morrer, a história do jovem francês começou com um acidente de carro, em 2000. Aos 19 anos, Vincent perdeu todos os sentidos, exceto a audição e a inteligência. Ele movimentava ligeiramente a mão direita com uma pressão do polegar a cada letra falada pela mãe. Pediu aos médicos pela eutanásia, mas não foi atendido. Em 2002, solicitou ao presidente Jacques Chirac um indulto antecipado a quem o ajudasse a morrer. Como também não teve sucesso, a mãe o ajudou, colocando uma overdose de sedativos em sua sonda. Dois dias depois, com estado de saúde cada vez pior, Vincent morreu. O chefe da equipe médica, Frédéric Chaussoy, assumiu ter desligado o respirador. Os dois foram processados por homicídio premeditado, mas absolvidos por pressão da opinião pública. Chaussoy escreveu o livro "Eu não sou um assassino".


(Fontes: Sylvia Colombo de Buenos Aires para a Folha SP 09/05/2012; EM, 29/04/2012; Correio Braziliense, 29/04/2012; O Estado atual do Biodireito, Maria Helena Diniz, Editora Saraiva, 2011, 8ª edição).

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