Na Inglaterra uma paciente psiquiátrica deverá ser amarrada para receber
anestesia geral. Depois, será submetida a cesárea. Foi o que decidiu um juiz da
Corte Superior de Justiça do país, ao analisar pedido do hospital onde a mulher
está internada. O pedido de parto cesariano forçado foi apoiado pelo marido e
pelo pai da grávida.
O caso revela, mais uma vez, a difícil situação em que é colocado um
juiz ao ter de tomar decisões por outra pessoa. Na Inglaterra, sempre que
alguém não pode decidir os próprios passos, é a Justiça que tenta se colocar no
lugar dessa pessoa e decidir como agir, nem sempre com o apoio da família.
No drama vivido pela gestante — conhecida apenas pelas iniciais A.A.,
para preservar sua identidade — o Judiciário foi chamado para agir não para
salvar o bebê, mas para evitar risco de morte da mãe. De acordo com os autos, a
mulher sofre de transtorno bipolar. Já chegou a ser internada em clínicas
psiquiátricas. Também abusava de bebidas e drogas para aliviar os sintomas da
doença.
Durante boa parte da gestação, ela esteve sã e, junto com seu
companheiro, fez todo o acompanhamento pré-natal necessário. Já com 38 semanas,
pouco antes da data prevista para o parto, A.A. sofreu um surto psiquiátrico e
teve de ser internada. Lá, os médicos constataram que ela havia sofrido uma
ruptura de membrana e, para não sofrer nenhuma infecção, deveria parir o bebê
em pouco tempo. Caso contrário, poderia morrer.
Dois dias depois da internação, ela ainda não tinha entrado em trabalho
de parto e não estava disposta a colaborar com o tratamento. Para os médicos,
existiam duas alternativas: começar a induzir o parto normal, o que dependeria
da colaboração da gestante, ou submetê-la a uma cesárea, mesmo contra a sua
vontade. A segunda opção foi a escolhida por reduzir os riscos para a mulher.
Para isso, o hospital pediu à Justiça uma liminar autorizando a cesárea
forçada. Tanto o marido como o pai dela depuseram a favor da decisão médica. De
acordo com os relatos, a grávida estava emocionalmente exausta e não conseguia
compreender a situação de risco em que se encontrava.
O procedimento foi autorizado pelo juiz Hayden, que considerou que a
principal preocupação deveria ser a saúde da mulher. Ele autorizou o hospital a
amarrá-la para dar a anestesia geral necessária para a cesariana — já que A.A.
não ficaria quieta durante a cirurgia. Também liberou os médicos para
restringirem a liberdade da paciente depois da operação, até que ela esteja
recuperada e em condições de deixar o hospital. [Clique aqui para
ler a decisão em inglês]
Justiça aberta
No julgamento, o juiz Hayden ressaltou um ponto importante que vem se
tornando uma constante na Justiça inglesa: a publicidade. Hayden explicou que,
por envolver a restrição da liberdade de uma pessoa, o caso era automaticamente
de interesse público e, por isso, todo o julgamento deveria ser aberto à
sociedade. A decisão foi publicada e está acessível para todos, com a condição
de que o nome dos envolvidos não seja revelado.
O episódio remonta a um drama vivido ano passado por outra mulher
grávida obrigada a fazer cesárea. Esse, no entanto, teve um desfecho mais
dramático. O bebê foi retirado da mãe e colocado para adoção. A semelhança
acontece pela transparência dada a uma história que, a princípio, interessaria
só à família envolvida.
No caso de 2013, o processo transcorreu em segredo de Justiça por meses,
até que foi parar nas páginas dos jornais e um tribunal decidiu que o melhor
era quebrar o sigilo, para que a verdade processual pudesse vir à tona. Foi um
marco para a Justiça. Pouco depois, os juízes de família foram orientados a dar
publicidade aos seus julgamentos sempre que possível, desde que o nome das
partes seja preservado.
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