Oh, happy day
Mais um “Oh, happy day” no Tribunal de Justiça,
ontem. Revirada (mantenha, revisor), mais uma sentença. De fato esperei mais de
três horas para falar. Pensam que me importei com a espera? Nada disso. É o momento
de ver como os colegas e os magistrados trabalham. E de ver como as pessoas
existem, é um exercício de aprendizado das pessoas, além do Direito que
compulsoriamente vamos ouvindo. De novo vou falar: havia só quatro mulheres na
sessão, comigo, de resto, só homens magistrados e advogados, muitos. Havia
quatro servidoras muito atentas às sustentações orais.
O bardo
Eis que o bardo
inglês adentra ao plenário, sim, ele, Shakespeare (calma, gente, é só metáfora).
Desenrola-se na tribuna a peça O Mercador
de Veneza. Coisas de agiotagem. Pelo Shylock mineiro, digo, pelo apelante,
um dos príncipes do foro (não direi, não direi, ele se reconhecerá se calhar de
ler o Blog), pela vítima, digo, pelo apelado, convicto advogado entrado em anos,
mas firme. Disse o advogado: o nonagenário
foi sangrado. Shakespeare puro, a libra de carne de Antônio, a simbologia
do sangramento.
A libra de carne
que eu pretendo
Comprei-a bem
cara, é minha e quero tel-a;
Se m’a recusaes,
ai das vossas leis!
O direito de
Veneza então está sem força.
... Eu invoco a
lei;
... A meu favor
está no meu título. (O Mercador de Veneza, William Shakespeare).
E não acabou aí.
Não é que o advogado do agiota, digo, do apelante invocou a lei, tal qual
Shylock? Nada de anular os títulos, basta tirar os
juros excessivos, segundo a lei tal e qual.
Impressionante. A
vida imita a arte. O relator já falou e enquadrou o apelante, o revisor pediu
vista. Já adivinho o resultado. Creio que o Shylock moderno não terá sequer o
principal.
O que ficou da
tarde no tribunal, o *leitmotiv de todas as causas ali
discutidas: l’argent, din din, pecúnia,
basta ver as causas do dia: minha cliente necessitada da assistência judiciária, o nonagenário endividado, o valor do aluguel
da pizzaria, os dividendos dos acionistas. Não é à toa que dizem que é a mola
que move o mundo. É como dizem os americanos: não existe almoço grátis.
*Leitmotiv: palavra alemã
que significa o motivo condutor ou principal. Não é que este Blog está chique,
demais?
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