quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Mensalão: um apanhado e um vazamento

Sim, é verdade, a dona do Blog ausentou-se da redação e sumiu no cerrado. Na volta confessou que a supressão de tecnologia durante alguns dias é extremamente salutar. E relutou em reabrir a caixa de e-mails, ah, a tecnologia sedutora e que aprisiona.

Salutar também foi saber que deixou saudade, nos reclamos de preclaro leitor pela ausência e do rumo tomado pelo Blog na volta, nada de sertão, volte incontinenti à Ação Penal 470 que o trem está pegando fogo.

Sim, sim, não saímos completamente do ar. No sertão também tem Globonews e acompanhamos a irritação de Barbosa com os rumos do voto de Lewandowsky. A importância exagerada que a jornalista Catanhêde deu ao comentário do revisor sobre julgamento pouco ortodoxo. 

Ora, dizemos nós, afinal, não é todo dia que se julga tão grande número de indiciados em tão sofisticada engenharia financeira, política e marqueteira em cadeia nacional. Alguma heterodoxia há de ter.

Mas o que desagradou sobremaneira foi o rompante do Relator (são as dores, com certeza). Deixa o revisor votar como lhe aprouver, conversava eu com o televisor. Ainda que o voto nos cause espanto e desperte outros tantos pensamentos ... 

Que espetáculo para as massas. Mentira, as massas não querem saber, acham, e com razão, enfadonho demais o julgamento, juridiquês demais, empolação demais. Estão mais interessadas nos jogos do campeonato que corre por aí e nas ensurdecedoras duplas sertanejas universitárias (um verdadeiro show de horror para ouvidos sensíveis e entre eles alguma massa cinzenta mediamente desenvolvida). Perdoem, perdoem a franqueza excessiva, às vezes me escapa.

Chamada ao prumo pelo seu mais fiel e aguerrido Leitor, a redatora não se faz de rogada e apresenta o dever de casa, não fará como o revel que recebe o processo no estado em que se encontra e toca o bonde em frente. Nem seguirá a cartilha administrativa de Jayme Lerner (ex-prefeito de Curitiba para quem não se lembra), e segundo a qual, não se administra para trás, em suma, o que passou, passou. Aqui não.

Já estamos há um mês e meio de julgamento do mensalão, nesse meio tempo o Supremo condenou 10 dos 37 réus e inocentou outros três. De acordo com os ministros do Supremo, ficou comprovado um esquema de desvios de recursos públicos da Câmara dos Deputados e do Banco do Brasil, além de operações junto ao Banco Rural para ocultar a destinação de dezenas de milhões de reais, provenientes de empréstimos fictícios e fraudulentos.

Relembrar é viver

6 de setembro
O STF terminou de analisar o capítulo 5 da denúncia e condenou três diretores do Banco Rural por gestão fraudulenta de instituição financeira. Kátia Rabello e José Roberto Salgado foram condenados por unanimidade. Os ministros Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio Mello votaram pela absolvição de Vinícius Samarane. O relator, Joaquim Barbosa, foi o único a votar pela condenação de Ayanna.

10 de setembro
O relator Joaquim Barbosa votou pela condenação de nove réus por lavagem de dinheiro. Ele considerou culpados o empresário Marcos Valério Souza, seus dois ex-sócios, Cristiano Paz e Ramon Hollerbach, seu advogado, Rogério Tolentino, duas funcionárias do grupo, Simone Reis e Geiza Dias, e três pessoas do Banco Rural, a sócia Kátia Rabello, o ex-vice-presidente José Roberto Salgado e o executivo Vinícius Samarane. Barbosa votou pela absolvição da ex-diretora do Rural Ayanna Tenório.

12 de setembro
O revisor Ricardo Lewandowski condenou seis réus por lavagem de dinheiro e inocentou quatro. O ministro considerou culpados a dona do Banco Rural, Kátia Rabello, o ex-vice-presidente do banco José Roberto Salgado, o empresário Marcos Valério e seus ex-sócios Ramon Hollerbach e Cristiano Paz, além de Simone Vasconcelos, diretora da agência de publicidade. Lewandoswski considerou inocentes a ex-diretora do Rural, Ayanna Tenório, o vice-presidente Vinicius Samarane, Geiza Dias, ex-funcionária de Valério, e Rogério Tolentino, advogado do empresário.

13 de setembro
O STF concluiu o julgamento da parte sobre lavagem de dinheiro no mensalão, condenando oito réus e absolvendo dois pelo crime. Os ministros entenderam que houve desvio de recursos públicos, que empréstimos foram simulados e que a origem da verba foi omitida. Os ministros consideram culpados por lavagem Kátia Rabello, José Roberto Salgado, Vinicius Samarane, Marcos Valério, Cristiano Paz e Ramon Hollerbach, Rogério Tolentino e Simone Vasconcelos. Os ministros absolveram Ayanna Tenório e Geiza Dias. Ao todo, 10 dos 37 réus já sofreram algum tipo de condenação. Por outro lado, três foram absolvidos.

17 de setembro
Joaquim Barbosa começou a analisar parte da denúncia de que houve compra de apoio político, que envolve o núcleo político, entre eles o ex-ministro José Dirceu, parlamentares e partidos políticos. Depois de afirmar que não tem dúvidas de que houve o mensalão Barbosa indicou entender que houve crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha cometidos por três réus do PP, entre eles o deputado Pedro Henry (PP-MT), e dois sócios da corretora Bônus Banval. (Fonte: Folha de SP).

Desse período o Blog fica com as frases pinçadas da criatividade que brota aos borbotões dos ministros e que demonstram toda a heterodoxia do julgamento:

Ricardo Lewandowski: "Só se lava ou branqueia o que está sujo".

Luiz Fux: "Não deveria nem ser gestão fraudulenta, deveria ser gestão tenebrosa".

Luiz Fux: "Quem sofre infarto não manda beijo, quem manda beijo não sofre infarto".

Luiz Fux: "O dinheiro lícito e o ilícito não são como a água e o óleo, ou seja acabam se misturando".

Luix Fux: "Era o beijo da morte que ela [Geiza Dias] dava no final dos e-mails".

Luiz Fux: "É um momento extremamente dramático participar de um processo penal que resulta em uma condenação".

Dias Toffoli: "Só conheço uma pessoa condenada por um beijo, foi Jesus Cristo. O fato de mandar beijo não é motivo para condenar". (Ai, ai, ai).

Dias Toffoli: "Uma coisa é um frentista que põe o combustível sem saber que aquele combustível está adulterado. Outra coisa é um frentista que coloca o combustível sabendo que ele está adulterado. [Geiza Dias] era a frentista do posto de gasolina que não tinha a menor ideia se o combustível era adulterado ou não". (Depois dizem que é implicância minha).

Cármen Lúcia: "O dinheiro é para o crime o que o sangue é para a veia. Se não circular com volume sem obstáculos não temos criminosos  como esse".

Cármen Lúcia: "O crime precisa de dinheiro para sobreviver. Sem ele, se tem a necrose do crime".

Marco Aurélio: "A cada passo complica-se a situação dos acusados. Diria no jargão carioca, haja coração ante o fatiamento".

Gilmar Mendes: "Já estou rouco e cansado de ouvir".

Falaram os ministros da mais alta corte do país.

Para fechar com alguma leveza e quiça, elevação, o sempre poeta

Ayres Britto: "Assim como o rio é um só rio da nascente à foz, a denúncia é a mesma de ponta a ponta".

Ayres Britto: "O universo e a esperteza humana não têm limites; sobre o primeiro eu tenho dúvidas", parafraseando Einstein.

Ayres Britto: "Há muito método nessa loucura", citando Shakespeare.


E o assunto não acaba, ainda houve vazamento, por engano (que fique claro) pela internet da dosimetria das penas do voto de Barbosa. Retirado o documento do ar, avisou Barbosa que também as penas podem ser alteradas. Para quem não acessou o site do STF de sexta à noite à noite de domingo, o Blog conta. Era assim:

Barbosa fixou a pena do empresário Marcos Valério Fernandes de Souza para o crime de lavagem de dinheiro em 12 anos e sete meses de reclusão, além de 340 dias-multa (referência adotada pelo Judiciário para definir penas pecuniárias, que tem valor variável). No caso de Valério, o montante chega a cerca de R$ 850 mil.

Para a dona do Banco Rural, Kátia Rabello, e para o ex-vice-presidente da instituição, José Roberto Salgado, o relator votou por dez anos de reclusão. Para ela, mais cerca de R$ 937 mil em dias-multa. Para ele, R$ 625 mil.

Nos três casos, Barbosa votou pelo início do cumprimento da pena em regime fechado, "sendo incabível" a substituição por penas restritivas de direitos. Além disso, votou pela perda, em favor da União, "dos bens, direitos e valores objeto do crime".

Agora é esperar pelas fatias finais.



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