terça-feira, 6 de maio de 2014

A tríplice função da indenização do dano moral: Uma experiência romana



Artigo

Sílvio de Magalhães Carvalho*





                                                         





Sobre as funções da indenização dos danos morais, o professor Valdir Florindo, em sua obra “Dano Moral e Direito do trabalho” (Ed. LTr, 2ª edição, p. 131), leciona, tomando como exemplo a Lei das XII Tábuas que, segundo ele já naquela Lei se previa o dever de indenizar danos morais, mas por um valor irrisório, que não desestimulava a reiteração da ofensa. Conta que o parágrafo 9º da Lei estabelecia que “aquele que causar dano leve deverá indenizar 25 asses”, mas cita curiosa passagem que demonstra que o valor da indenização deve ser suficiente para recrutar a atenção do ofensor:
“Conta-se que um certo Lucius Veratius se deliciava verberando (esbofeteando) com a sua mão o rosto dos cidadãos livres que encontrava na rua.  Atrás de si vinha um seu escravo entregando 25 asses a todos em que o dominus batia.”
O cidadão Romano Lucius Veratius não se sentia desestimulado pelo valor legalmente fixado, de modo que continuava a distribuir tabefes aos que cruzavam seu caminho, evidenciando que a lei não protegia a sociedade.
O valor deve trazer certa repercussão no patrimônio do ofensor, de modo que tanto a finalidade reparatória e preventiva sejam preservadas, dando à norma e a pessoa a dignidade devida. Mais que isto, deve o valor satisfazer o caráter sócio-pedagógico, remetendo a toda comunidade (potenciais ofensores e vítimas) que o Estado Juiz é, a um só tempo, solidário e firme.
Importante considerar a posição de Lucius, em que a ofensa se dava pela vontade livre do agressor, ação e consciência buscando aquele resultado. Também assim quando há culpa grave ou gravíssima, quando o ofensor se comporta como se não se importasse com eventual dano a outrem.
Em tais circunstâncias a indenização precisa ser significativa. Não se propõe uma indenização desproporcional, em afronta aos limites propostos pela cabeça do artigo 944 do CC/02, mas a indenização integral preconizada no artigo 927 do mesmo código, de todos os ilícitos referidos na cabeça do artigo 186, assegurada no inciso III do art. 1º da Constituição.
É que a ação dolosa, ou com culpa grave ou gravíssima implica sempre em um dano moral, pela agressão à dignidade humana, que é fundamento da República, e por representar desafio ao ordenamento e a Justiça, dano que deve também ser indenizado, dano que é proporcional à capacidade econômico- financeira do ofensor, pois nela está apoiada sua conduta.
É o caso, por exemplo, de condutas lesivas repetitivas e reiteradas, especialmente aquelas que se mantém mesmo após serem condenadas pelo Judiciário, a revelar que o ofensor “joga” com os valores das condenações e o custo das medidas necessárias para evitar os danos reiterados.
Por isto o dano moral decorrente de ações dolosas ou com culpa grave ou gravíssima, que denotam desdém com a sociedade ou com a lei, especialmente quando motivadas pelo lucro, deve ser tal que atenda, além da função reparatória e preventiva, a de caráter sócio-pedagógico, de modo a confortar as vítimas e desestimular novas agressões.




* Advogado independente em Belo Horizonte/MG, graduado pela PUCMG, Especialista em Direito Empresarial pela Fundação Dom Cabral, membro colaborador das Comissões de Direito Sindical e Estágio e Credenciamento de Advogados da OAB/MG.

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