quarta-feira, 4 de outubro de 2017

O ministro no rádio

Na terça-feira logo pela manhã se me deparei [i] com a figura do ministro do STF Alexandre de Moraes na transmissão pela internet do programa de rádio Jornal da Manhã da Jovem Pan FM São Paulo.

De novo? Não bastou uma hora e vinte minutos, duração total do programa O é da Coisa da Band News no dia 29/9/17, também transmitido por imagem?

Trago ainda algumas lições da Faculdade de Direito, aquelas máximas acrescidas à matéria, que carregamos pela vida afora e volta e meia batem nos ouvidos como um sino, um apito, um alerta. Juízes falam nos autos, é a máxima. Daí a surpresa, daí o se me deparei com a habitualidade e desenvoltura do magistrado ante os microfones e as câmeras.

Sobre o que falava o ministro? Sobre o programa noturno confesso não tive paciência de emprestar meus ouvidos. Logo no início o dono do programa, o jornalista Reinaldo Azevedo advertiu a audiência que o ministro, convidado especial, não poderia falar sobre casos julgados pelo STF e que falaria em tese sobre Aécio, delação, ativismo do Supremo.

Confesso dificuldade em ouvir o ministro, a emissão de voz não é clara, o tom é monocórdio, as frases enormes e encadeadas; digressões sem conclusão, concluo.

Lá pelas tantas, sobre as imunidades parlamentares (medidas cautelares impostas ao Senador Aécio Neves) o ministro disse que “estava absolutamente tranquilo em dizer”, “já havia dado o voto na terça-feira, o voto é público, já publicado” e deitou a falar sobre seu voto.

O apito soou novamente, juízes falam nos autos. O ministro pretendia explicar seu voto aos ouvintes e internautas. Interrompi ali, não é tarefa de ministro, acredito, falar fora dos autos sobre seus votos é exorbitar de suas funções.

Dias depois lá está novamente em outra emissora, falando em tese de caso que iria julgar, como relator de habeas corpus impetrado pela Defensoria Pública da União para transferência de 55 presos de volta ao Rio de Janeiro. Não estou dizendo do caso concreto, asseverou o ministro. Como? Em resumo o que disse o ministro: analisei superficialmente, dei vista à Procuradoria antes de proferir a liminar, vou analisar sob a ótica da legalidade e da segurança pública.

De novo falou sobre as medidas cautelares impostas ao senador Aécio Neves. Pergunta: recolhimento é ou não prisão?

Não quero avançar muito, disse o ministro, só em tese. Sei.

Respondeu: há dois aspectos, antinomia na lei de execuções penais, deu exemplos, qdo não existir a casa de albergado o juiz pode estabelecer o regime albergue domiciliar. Há 2 previsões legais idênticas, há esta antinomia que deve ser analisada pelo STF.

Concluo: digressões sem conclusão.

Ou seja, não respondeu, mas, falou sobre casos afetos ao STF, segundo ele e seus entrevistadores, tudo em tese.

As aparições do ministro confirmaram, no meu modestíssimo entendimento, que juízes devem falar nos autos.




[i] No significado de aparecer inesperadamente, é usado como pronominal, em construção que o referido gramático realça ser clássica. Ex.: "Ao se lhe deparar crasso erro na sentença, interrompeu a leitura dos autos". 22Cf. SACCONI, Luiz Antônio. Nossa Gramática. 1. ed. São Paulo: Editora Moderna, 1979. p. 220. (José Maria da Costa, in Migalhas, nota 5,  http://www.migalhas.com.br/Gramatigalhas/10,MI45095,71043-Deparar).

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