A Terceira
Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu parcial provimento a recurso especial
para fixar que o quinhão hereditário a que faz jus a companheira, quando concorre
com os demais herdeiros – filhos comuns e filhos exclusivos do autor da herança
–, deve ser igual ao dos descendentes quando se tratar dos bens particulares
do de cujus.
O recurso foi interposto pelo Ministério Público do
Rio Grande do Sul contra acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul
que, em sede de agravo de instrumento no curso de ação de inventário de bens,
decidiu que os institutos do casamento e da união estável deveriam ter
tratamento diferente e que, em relação aos bens adquiridos na constância da
união estável, caberia à companheira receber quinhão hereditário igual ao dos
filhos comum e exclusivos do inventariado.
Para o MP, concorrendo a companheira com o filho
comum e, ainda, com os filhos exclusivos do falecido, deveria ser adotada a
regra do inciso II do artigo 1.790 do Código Civil, pois esta seria a que melhor
atenderia aos interesses dos filhos – ainda que a filiação seja híbrida –, não
se podendo garantir à convivente cota maior em detrimento dos filhos do
falecido, pois já lhe cabe a metade ideal dos bens adquiridos onerosamente
durante a união.
O Ministério Público alegou também violação ao
artigo 544 do Código Civil por força da doação de imóvel pelo de cujus à
sua companheira em 1980 (bem que integraria o patrimônio comum dos
companheiros, pois foi adquirido na constância da união).
No caso analisado, o homem viveu em união estável
com a recorrida de outubro de 1977 até a data do óbito, tendo com ela um filho.
Além desse filho, o falecido tinha seis outros filhos exclusivos.
Inconstitucionalidade
O relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino,
afirmou que o Supremo Tribunal Federal já havia reconhecido como
inconstitucional a diferenciação dos regimes sucessórios do casamento e da
união estável, ao julgar o RE 878.694.
"Ocorre que o artigo 1.790 do CC foi
declarado, incidentalmente, inconstitucional pelo Egrégio Supremo Tribunal
Federal, quando do julgamento do RE 878.694, sendo determinada a aplicação ao
regime sucessório na União Estável o quanto disposto no artigo 1.829 do CC
acerca do regime sucessório no casamento", observou.
Concorrência
Sobre o reconhecimento, pelo acórdão recorrido, de
que a convivente teria direito ao mesmo quinhão dos filhos do autor da herança
em relação aos bens adquiridos na constância do casamento, o ministro observou
que, ao julgar o REsp
1.368.123, a Segunda Seção do STJ fixou entendimento de que, nos
termos do artigo 1.829, I, do CC de 2002, o cônjuge
sobrevivente, casado no regime de comunhão parcial de bens, concorrerá com os
descendentes do cônjuge falecido somente quando este tiver deixado bens
particulares, e a referida concorrência será exclusivamente quanto aos bens
particulares.
Sanseverino explicou que, quando "reconhecida
a incidência do artigo 1.829, I, do CC e em face da aplicação das normas
sucessórias relativas ao casamento, aplicável o artigo 1.832 do CC, cuja
análise deve ser, de pronto, realizada por esta Corte Superior, notadamente em
face da quota mínima estabelecida ao final do referido dispositivo em favor do
cônjuge (e agora companheiro), de ¼ da herança, quando concorre com seus
descendentes".
De acordo com o relator, o Enunciado 527 da
V Jornada de Direito Civil fixou que a interpretação mais razoável do enunciado
normativo do artigo 1.832 do Código Civil é a de que a reserva de 1/4 da
herança se restringe à hipótese em que o cônjuge concorre com os descendentes
comuns.
Descendentes
Segundo o ministro, tanto a Constituição Federal
(artigo 227, parágrafo 6º) quanto a interpretação
restritiva do artigo 1.834 do CC asseguram a
igualdade entre os filhos e o direito dos descendentes exclusivos de não verem
seu patrimônio reduzido mediante interpretação extensiva da norma.
Para Sanseverino, não é possível falar em reserva
quando a concorrência se estabelece entre o cônjuge e os descendentes apenas do
autor da herança, ou, ainda, em hipótese de concorrência híbrida, ou seja,
quando concorrem descendentes comuns e exclusivos do falecido.
"É de rigor, por conseguinte, a parcial
reforma do acórdão recorrido, reconhecendo-se que a recorrida concorrerá com os
demais herdeiros apenas sobre os bens particulares (e não sobre a totalidade
dos bens do de cujus), recebendo, cada qual, companheira e filhos,
em relação aos referidos bens particulares, o mesmo quinhão", concluiu.
O ministro entendeu não ter sido demonstrada
violação à legislação no questionamento trazido pelo MP em relação à validade
de doação da sua propriedade de imóvel feita pelo finado à sua companheira em
1980.
Leia o acórdão.
Processo: REsp 1617501
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