quinta-feira, 5 de dezembro de 2024

Indo além das sandálias



Depois de meses aguardando um despacho preliminar finalmente recebo notícia de movimentação processual. Haverá sido concedida a tutela (que deveria ser antecipada), meses depois?

Ainda não. O juiz federal resolveu mandar a autora modificar o valor da causa no mandado de segurança para prestar fase de concurso porque entendia que a causa tinha sim valor econômico imediato.

Ora, ora. E não só, julgou mal a parte (o advogado, na verdade), por causar dano ao erário público ao atribui valor simbólico à causa.

E ainda se jactou de não permitir tal coisa de forma nenhuma, não abria mão, etecetera.

Uma profunda inspiração é necessária antes de responder sua excelência.

Do que lançaríamos mão? Comunicação não violenta? Ironia, jamais.

Vejam só o que é o direito, o que nos parece óbvio, a falta de conteúdo econômico imediato pelo simples fato de não haver garantia de aprovação, assim não pareceu ao magistrado.

Daí a julgar mal o advogado que estaria lesando os cofres públicos é ir muito além das sandálias.

Foi imperativo neste caso (e disso não abrimos mão), desfiar julgados de tribunais favoráveis ao entendimento do advogado. Um, dois, três, quatro. E de peso.

Fechando com a derradeira pá de cal, a conclusão do Ministro Demócrito Reinaldo no julgamento dos Embargos de Declaração no Recurso Especial n. 68.345:

No processo de mandado de segurança é inócua a instauração do incidente do valor da causa, por manifestamente inútil, já que, nele, são incabíveis os honorários advocatícios (Relator o Ministro Demócrito Reinaldo, Primeira Turma, STJ, DJ 18.12.1995).

O juízo federal havia determinado juntada de prova documental. O que juntar neste caso? A tabela de custas do TRF6, além de portaria da presidência estabelecendo que nas causas de valor inestimável, seja qual for o valor simbólico atribuído, as custas serão de valor fixo, R$ 10,64, metade na inicial, metade na apelação.

Por fim, um parágrafo alegando que a atribuição de valor simbólico à causa não decorre de descuido com os fundos da Justiça contrário aos interesses do País, mas sim de adequação ao objeto da causa, qual seja, readmissão para prestar as fases seguintes do certame, tão somente.

Depois de responder este petardo, tive exemplos opostos de dois juízes estaduais.

Numa audiência de tentativa de conciliação presencial requereu-se para o réu a possibilidade de realização por videoconferência devido ao seguinte fato: portador de quadro depressivo grave sujeito a agravamento se exposto a pessoa ligada aos acontecimentos que desencadearam o quadro.

Foi concedida a forma virtual diante do relatório médico.

Observei que o enquadramento só mostrava o advogado, ocultando a autora.

Como não contava com este cuidado do juízo o réu sequer olhou para a tela durante toda a audiência.

Noutro caso, o juiz referia-se às partes nos despachos e na sentença pelos próprios nomes, Maria e João, por exemplo, deixando de lado o habitual “requerentes”. Pareceu-me um modo quase carinhoso de tratar as partes, reconhecendo-as como pessoas fora da vala comum do termo técnico.


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